Em um canteiro de obras, no bairro Vila da Serra, em Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), um grupo de trabalhadores, entre eles serventes, mestres de obra, engenheiros e pedreiros, permanecem sentados, atentos, escutando a uma palestra. Com papeis verdes, vermelhos e amarelos nas mãos, cada um deles indicando, respectivamente, concordância, discordância ou dúvida, eles são convidados a levantar os braços e se posicionarem diante de algumas questões.
“O homem deve ser forte, provedor e trabalhador”, “As mulheres são sensíveis, amáveis e cuidadoras”, “Meninos devem iniciar a vida sexual antes das meninas”, “A violência doméstica só acontece de vez em quando”, “A violência doméstica acontece mais entre as famílias pobres e de pouca instrução”. Uma a uma, frases como essas, com afirmações sobre os papéis dos homens e das mulheres na sociedade, as formas como meninos e meninas são criados e a questão da agressão à mulher, no ambiente familiar, são pronunciadas, provocando no público reações diversas.
A dinâmica, que teve por objetivo levar ao grupo reflexões sobre o tema da mulher em situação de violência doméstica e familiar, foi proposta pela psicóloga Rebeca Rohlfs Gaetani Barbosa, durante palestra realizada na manhã desta quinta-feira, 25 de outubro. A atividade integrou as ações da 20ª Semana Interna de Prevenção de Acidentes do Trabalho (Sipat) da Conartes Engenharia e Edificações Ltda. A palestrante é coordenadora de projetos sociais do Instituto Albam, parceiro da Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar (Comsiv) do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), um dos apoiadores do evento de hoje.
Aos trabalhadores, a palestrante Rebeca Rohlfs não apenas levou reflexão sobre o tema, mas também informações sobre a Lei Maria da Penha, os tipos de violência que a legislação prevê – como a física, a psicológica e a patrimonial –, as consequências dessas diversas formas de agressão para as vítimas e a importância de os homens escutarem suas companheiras e de estabelecerem com elas uma comunicação não violenta, entre diversos outros pontos.
Rebeca Rohlfs também levou aos trabalhadores da construtora dados sobre a violência doméstica no País, indicando que, no Brasil, a cada 15 segundos, uma mulher é espancada, 95% dos homicídios de mulheres são cometidos pelos companheiros delas e, em média, as vítimas demoram nove anos para fazer a primeira denúncia contra o agressor. “A violência doméstica e familiar acontece em todas as classes sociais e traz inúmeras consequências para as mulheres, como depressão, baixa autoestima, síndrome do pânico, fibromialgia, obesidade e abuso de álcool, entre diversas outras”, ressaltou.
Cerca de 180 funcionários da construtora e de empreiteiras parceiras da empresa – trabalhadores das equipes de administração da obra (engenheiro, mestres, encarregados, estagiário), do operacional (servente, pedreiros, carpinteiros/armadores, eletricista e hidráulica) e da assistência técnica compuseram o público da palestra, a quase totalidade deles, homens. “Gostei muito da palestra, pois ela trouxe mais conhecimento para todos nós sobre a Lei Maria da Pena. Todo mundo já ouviu falar dela, mas é preciso entender mais sobre o assunto, sobre as outras formas de violências que ela prevê e que muitos de nós não conhecíamos, como a violência patrimonial ou a sexual dentro do relacionamento”, avaliou o engenheiro Ricardo Alexandre Xavier.
O encarregado de hidráulica Warley Antônio Teixeira também gostou da escolha do tema da palestra e avaliou ser muito importante levar a discussão sobre o assunto para dentro do canteiro de obras. “Às vezes, o homem pode não saber que a forma como ele está agindo é um tipo de agressão. Por isso, é importante sim conhecer a lei. Agora, a gente pode até conversar sobre os colegas sobre isso”, observou.
“Utilizamos os serviços do Serviço Social da Indústria da Construção Civil no Estado de Minas Gerais (Seconci-MG), na área de promoção da saúde e da prevenção de doenças para trabalhadores da construção civil, e a entidade nos propôs esta palestra, aproveitando a oportunidade do evento da Sipat. Avaliamos que o momento era oportuno para a discussão desse tema tão atual”, conta a coordenadora de qualidade da Conartes, Patrícia Martins.
Instituto Albam
Membro-fundadora do Instituto Albam, a psicóloga Rebeca Rohlfs tem sido responsável por consultorias, cursos, capacitações, treinamentos e atendimentos clínicos, no Brasil e no exterior, além de publicações técnicas e científicas e apresentações em congressos. “A palestra de hoje foi uma ótima oportunidade para eles, mas também para nós. É muito interessante perceber como a sociedade está mudando e tem refletido e se interessado sobre o tema”, avalia a psicóloga, que já esteve à frente da Coordenadoria Especial de Políticas para as Mulheres do Estado de Minas Gerais.
O Instituto Albam é uma organização não governamental, fundada em 1998, pioneira no desenvolvimento de grupos reflexivos com homens autores de violência de gênero e mulheres em situação de violência, atuando em parceria com o Poder Judiciário e com a Secretaria de Defesa Social do Estado de Minas Gerais. O instituto promove também capacitações, seminários e cursos na temática de gênero e violência. Recebeu diversos prêmios, com destaque para o Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), concedido pela ONU e governos federal e estadual.
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