Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais

Jornada debate desafios no cumprimento da Lei Maria da Penha

Evento do CNJ reúne representantes do sistema de justiça e da sociedade civil


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A 16ª Jornada Maria da Penha foi realizada na sede do CNJ, em Brasília, nesta terça-feira (23/8) (Crédito: Cecília Pederzoli)

Os desafios e as boas práticas no cumprimento da Lei 11.340/2006 foram discutidos durante a 16ª Jornada Lei Maria da Penha, realizada na sede do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília, nesta terça-feira (23/8). Iniciativa do CNJ, a jornada reúne representantes do sistema de justiça e profissionais que atuam no combate à violência contra a mulher. Ao final da edição, foi produzida uma Carta com propostas de ação para aprimorar a Política Judiciária Nacional de enfrentamento à violência contra as mulheres. 

Entre os pontos aprovados na Carta, está a necessidade de fomentar a capacitação de magistrados, servidores e profissionais da rede de enfrentamento em relação a diversos temas e assuntos relacionados à prevenção e ao combate à violência contra a mulher, bem como à garantia dos direitos das mulheres.

A desembargadora Evangelina Castilho Duarte, superintendente da Coordenadoria da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (Comsiv/TJMG), acompanhou o evento remotamente. Entre as autoridades presentes no CNJ estava a desembargadora do TJMG Paula Cunha e Silva, presidente do Colégio de Coordenadores da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar do Poder Judiciário Brasileiro (Cocevid), que fez pronunciamento no encerramento do evento.

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Desembargadora Evangelina Castilho Duarte, superintendente da Comsiv, disse que o enfrentamento da violência contra as mulheres exige a conscientização de todos, com reflexões amplas e profundas de suas consequências (Crédito : Riva Moreira/TJMG)

“Estamos em busca do aperfeiçoamento da política judiciária dedicada a esse tema, que é essencial. O enfrentamento da violência contra as mulheres exige a conscientização de todos, com reflexões amplas e profundas de suas consequências”, afirmou a presidente do Cocevid. Para a desembargadora Paula Cunha e Silva, a violência doméstica e familiar é um desafio histórico, que toca raízes profundas da sociedade.

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A desembargadora Paula Cunha e Silva lembrou que a violência doméstica é um desafio histórico, que toca raízes profundas da sociedade brasileira (Crédito: Cecília Pederzoli)

A magistrada defendeu a necessidade da união de esforços de todos os atores do poder público e da sociedade civil no combate à violência. “A atuação deve ser capaz de levar a modificações nos padrões de comportamento socioculturais estigmatizantes, que respaldam a tolerância à violência doméstica contra as mulheres”, disse. 

A desembargadora ressaltou ainda o trabalho das coordenadorias estaduais e falou sobre o desafio de fortalecer a atuação em rede. “É preciso ter persistência, porque os resultados não surgem rapidamente. Temos que ter fôlego. Perpassamos por um roteiro extenso até chegar ao atual estágio. E precisamos alcançar a maturidade para cumprir a nossa missão. Precisamos caminhar juntos, em harmonia e com diálogo, para que toda a rede esteja permanentemente mobilizada em prol da proteção dos direitos humanos das mulheres”, finalizou.

Para a desembargadora Evangelina Castilho Duarte, a realização da Jornada Lei Maria da Penha é muito importante para discutir a aplicação da legislação. Entre os temas abordados no evento e destacados pela superintendente da Comsiv do TJMG, estão o número de varas especializadas em funcionamento no Brasil, o volume de serviço nessas unidades judiciárias e as dificuldades enfrentadas pelo sistema de justiça. “Também foi debatida a necessidade de formar redes e de garantir um sistema célere e acolhedor para as vítimas.”

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A abertura da jornada foi conduzida pelo conselheiro do Conselho Nacional de Justiça Marcio Luiz Freitas (Crédito: Cecília Pederzoli)

Olhar diferenciado

Na abertura dos trabalhos, o conselheiro do CNJ Marcio Luiz Freitas declarou que a jornada é um momento importante para a discussão de uma lei e de uma política judiciária “absolutamente essencial”. “Não é possível se pensar em uma democracia efetiva quando mais de 50% da nossa população está sob risco e sem que tenhamos um estado aparelhado para proteger e prevenir violências”, disse. Na avaliação dele, há ainda um grande caminho a ser percorrido, quando se debate o tema da violência doméstica e familiar contra a mulher. “Mas muito já foi feito, e não podemos perder essa perspectiva histórica, para continuarmos seguindo em frente na criação de uma sociedade melhor”, pontuou.

O conselheiro Marcio Luiz Freitas observou que há hoje cerca de 145 varas exclusivas de Lei Maria da Penha, número insuficiente para a demanda existente. Na média nacional, segundo ele, as varas de violência doméstica e familiar recebem quatro vezes mais processos, por ano, em relação às varas criminais e o dobro de feitos, na comparação com as varas cíveis. “Precisamos de um olhar mais acolhedor para essa mulher vítima e vulnerável”, destacou.

Mudança de cultura

“É um prazer participar da comemoração dos 16 anos da Lei Maria da Penha. Como vítima de violência doméstica e representante da sociedade civil, tive o privilégio de conhecer essa legislação há muito anos, quando fui embaixadora do Instituto Avon. Já era uma pauta que eu conhecia e, quando sofri violência doméstica, a Maria da Penha foi a grande mulher que me incentivou a denunciar, até pela própria história de vida dela. Hoje, tenho a certeza de que tomei a decisão mais correta ao denunciar”, declarou a ativista Luiza Brunet, representante da sociedade e do Observatório de Direitos Humanos, que participou do evento.

Luiza Brunet exaltou a campanha Sinal Vermelho, criada pelo CNJ e pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), ação que visa incentivar as mulheres a denunciar as agressões sofridas, criando oportunidades para que peçam ajuda e levando mais conscientização sobre o ciclo da violência doméstica e familiar. “É muito importante o Judiciário e os magistrados estarem do nosso lado, realizando campanhas como essa e facilitando nossas vidas como vítimas. Isso nos dá um conforto enorme”, afirmou.

O conselheiro e presidente da Comissão da Defesa dos Direitos Fundamentais do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Otavio Luiz Rodrigues Júnior, manifestou sua satisfação em verificar o alinhamento das condutas, propósitos e estratégicas do Conselho que ele preside e o CNJ. Ele destacou que há recomendação do CNMP no sentido de estimular a realização de ciclos e debates em torno da temática, a exemplo da jornada promovida pelo CNJ.

“Essa iniciativa tem a função transversal de disseminar o conhecimento jurídico sobre o tema, mas, principalmente, de disseminar a necessidade de uma organização estratégica do sistema de justiça para fazer frente à violência doméstica e familiar contra a mulher. Estamos aqui a iniciar uma mudança de cultura da sociedade em relação a esse tipo de delito. A representação social da mulher precisa mudar e se transformar, para se adaptar às necessidades do século 21”, ressaltou.

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A professora e advogada Alice Bianchini, que é doutora em Direito Penal, discorreu sobre o tema da violência psicológica (Crédito: Cecília Pederzoli)

Efetividade à lei

A vice-presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada, Rejane da Silva Sanches, afirmou que contar com o aval do CNJ para renovar o debate sobre a Lei Maria da Penha significa priorizar, nacionalmente, a discussão sobre o assunto. “Significa arregimentar mais de 90 tribunais em todo o Brasil para a questão, analisando e expondo as dificuldades para a aplicação da lei, que ainda tem espaço de aprimoramento”, pontuou. Ela citou iniciativas da OAB, no enfrentamento do problema, e ressaltou que a questão deve envolver toda a sociedade.

“Tenho a esperança de que cada vez mais o Poder Judiciário, o Ministério Público, a Defensoria e o próprio Estado concretizem a importância dessa lei e de se evitar a violência, para que os atos de agressão sejam reduzidos. Temos profunda admiração pela mulher brasileira, a mãe, a trabalhadora, aquela a quem Deus concedeu o dom da vida, e que tantas vezes são vitimas de violência, que aumenta em tempos de crises. Meu apelo aos operadores do Direito, aos órgãos de investigação do Estado, para que a Justiça não tarde”, declarou o subprocurador-geral da República, Alcides Martins.

A presidente da AMB, juíza Renata Gil, afirmou que o Brasil é o quinto país que mais mata mulheres no mundo. “Mulheres morrerão hoje pela sua condição feminina, enquanto estamos aqui discutindo a proteção a elas. Isso é muito vergonhoso, pois estamos ao lado de países como Guatemala, Venezuela, Rússia e Honduras, que não cumprem tratados de direitos humanos. Nós temos a Lei Maria da Penha, que completa 16 anos, e temos 140 projetos legislativos que foram aprovados no último ano, que melhoram essa legislação, mas não conseguimos ainda dar efetividade a todos eles”, disse. 

A magistrada apresentou dados indicando que o número de medidas protetivas e de denúncias aumentou, no Brasil, enquanto o de feminicídios apresentou uma leve redução. “Os números melhoraram, mas ainda temos o desafio gigantesco de educar nossas mulheres no sentido de que elas têm esses direitos, de que as violências que são praticadas contra ela já estão na Lei Maria da Penha e elas precisam denunciar”, observou. A magistrada destacou o papel do Judiciário, em dar efetividade à lei. 

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Um dos painéis foi mediado pelo conselheiro do CNJ ministro Vieira de Mello Filho (Crédito: Cecília Pederzoli)

Violência psicológica e desafios 

As discussões, no turno da manhã, foram iniciadas com painel sobre o crime de violência psicológica, tendo como palestrante a professora e advogada Alice Bianchini, doutora em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e vice-presidente da Associação Brasileira de Mulheres de Carreira Jurídica. O ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Reynaldo Soares da Fonseca atuou como mediador dos trabalhos.

“A violência psicológica é silenciosa e, para ser descortinada, precisamos muito mais do que temos feito até agora. Precisamos de um tratamento, de uma análise e de uma perspectiva muito especial. Ademais, o dano emocional que a violência psicológica acarreta para as mulheres provoca uma série de outras consequências”, declarou a palestrante.

A professora observou que a violência psicológica tem o poder de minar a capacidade de resistência da vítima e de mantê-la refém da situação de agressão. Em sua análise do tema, Alice Bianchini ofereceu um olhar sob perspectiva infantil, mostrando dados e discutindo as consequências da violência doméstica e familiar contra as mulheres para crianças e adolescentes que crescem nos lares violentos. Ela apresentou dados e comentou legislações afetas ao tema.

Os desafios para a aplicação da Lei Maria da Penha foi o tema do segundo painel, tendo como moderador o conselheiro do CNJ ministro Vieira de Mello Filho. Atuaram como palestrantes a juíza do Tribunal de Justiça de São Paulo Maria Domitila Prado Manssur; a coordenadora-geral de Articulação Nacional de Combate à Violência Contra as Mulheres Renata Braz das Neves Cardoso; o promotor de justiça Thiago André Pierobom de Ávila, titular da 2ª Promotoria de Justiça de Violência Doméstica contra a Mulher de Brasília; e a defensora pública Flávia Nascimento, coordenadora de Defesa dos Direitos da Mulher da Defensoria Pública do Rio de Janeiro.

Encerrando as atividades na manhã, foram apresentados os resultados do diagnóstico técnico sobre a eficácia das medidas protetivas de urgência aplicadas nos casos de violência contra a mulher. O levantamento envolveu análises qualitativas e quantitativas, a partir das informações dos processos constantes na Base Nacional de Dados do Poder Judiciário (DataJud), e trouxe um retrato da utilização das medidas protetivas. Participaram da apresentação Daniela Grelin, diretora executiva do Instituto Avon; Gabriela Soares, diretora executiva do Departamento de Pesquisas Judiciárias do CNJ; e Leila Linhares e Myllena Calazzans, integrantes do Consórcio Lei Maria da Penha.

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No evento, foram apresentados os resultados do diagnóstico sobre a eficácia das medidas protetivas de urgência (Crédito: Cecília Pederzoli)

No turno da tarde, foi realizado painel sobre aplicação do protocolo de julgamento com perspectiva de gênero no contexto da violência doméstica. A palestra ficou a cargo da procuradora Ivana Farina, do Ministério Público de Goiás, com mediação da conselheira do CNJ Salise Sanchotene.

Na sequência, foram realizadas oficinas simultâneas em torno dos seguintes temas: especificidades do crime de violência psicológica e desafios para caracterização e prova do dano; questões controvertidas na aplicação da Lei Maria da Penha; e julgamento com perspectiva de gênero aplicado à violência doméstica contra a mulher.

O evento foi encerrado com a realização de uma plenária para a aprovação e a leitura da Carta elaborada durante o evento. 

A íntegra da 16ª edição da Jornada Maria da Penha está disponível no Canal do CNJ no YouTube.

Mesa de honra

Compuseram a mesa de honra da abertura o ministro do STJ Reinaldo Soares da Fonseca; o subprocurador-geral da República, Alcides Martins; a vice-presidente da Comissão Nacional da Mulher Advogada, Rejane da Silva Sanches; os conselheiros e conselheiras do CNJ ministro Vieira de Melo Filho, Mauro Martins, Salise Monteiro Sanchotene e Marcio Luiz Freitas; o conselheiro e presidente da Comissão da Defesa dos Direitos Fundamentais do CNMP, Otavio Luiz Rodrigues Júnior; a desembargadora Paula Cunha e Silva, presidente do Cocevid; a presidente da AMB, juíza Renata Gil; a presidente do Fórum Nacional de Juízas e Juízes de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (Fonavid), juíza Ana Cristina de Freitas Mota; a coordenadora da Comissão Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) Mulheres, juíza Camila Pullin; o presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), juiz Luiz Antônio Colussi; e a representante da sociedade e do Observatório de Direitos Humanos, Luiza Brunet.

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