
Um total de 436 atendimentos foi realizado nos dias 7, 8 e 9 de maio nas aldeias xacriabá Riacho dos Buritis, Barreiro Preto, Brejo Mata Fome e Rancharia, no município de São João das Missões, na comarca de Manga, como parte dos preparativos para a 2ª Semana Nacional do Registro Civil – Registre-se!, que acontece entre os dias 13 e 17 de maio. A edição deste ano é destinada a pessoas em situação de rua, populações indígenas, adolescentes do Sistema Socioeducativo e pré-egressos do Sistema Prisional.
O corregedor-geral de Justiça e presidente eleito do TJMG para o biênio 2024-2026, desembargador Luiz Carlos de Azevedo Corrêa Junior, abrirá a 2ª Semana Nacional do Registro Civil – Registre-se! no Uai Praça Sete, em Belo Horizonte, na segunda-feira (13/5), às 8h. A ação será realizada em todo os Estados e no Distrito Federal.
Aldeias
Os trabalhos nas aldeias xacriabá foram uma parceria do Sindicato dos Oficiais de Registro Civil de Minas Gerais (Recivil), do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), por meio da Corregedoria-Geral de Justiça, e da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), e envolveram diversos órgãos parceiros.
Nos três dias, foram realizados 436 atendimentos, uma média diária de 145, com coleta de dados para a emissão de segunda via de certidões de nascimento e de casamento e de carteiras de identidade nacionais - documento que entrou em vigor em novembro de 2023 e será o novo padrão para os brasileiros.
Além dos atendimentos, a equipe prestou esclarecimentos à população e ofereceu orientações sobre questões relacionadas, como divórcios, retificação de registros e os procedimentos para regularizar o casamento indígena, que era atestado administrativamente pela Funai, mas não tem valor civil. Inicialmente, estavam previstas três aldeias, mas o grupo de oficiais, com o apoio de três servidores da Funai, estendeu o atendimento à andeia Rancharia.

O caso de Modesto, da aldeia Pindaíba, de 43 anos, foi de registro tardio. Ele sempre utilizou apenas o registro indígena, e teve no Registre-se a oportunidade de fazer o registro civil pela primeira vez. “Meu pai não foi lá no cartório me registrar e hoje eu mesmo estou indo fazer isso. É uma sensação de muita alegria mesmo. Trabalhei esse tempo todo com os documentos indígenas. Só agora veio esse, mas graças a Deus deu tudo certo”, disse.

Laurisaura, da aldeia Barreiro Preto recebeu a equipe em casa, com cafezinho, biscoito e queijo. A professora sabia do procedimento de coleta de dados, mas, na correria dos afazeres, não conseguiu ir até a escola. “Que bênção, eu estava sem saber como ir ao Brejo amanhã. Vocês vieram até aqui!”, afirmou. Foi um presente de aniversário, já que a data do registro coincidiu com a do nascimento dela. Toda a família, segundo a professora, gosta muito de estudar. Além dela, o irmão e a cunhada são professores, há duas sobrinhas estudando Enfermagem e um cunhado cursa Medicina em Belo Horizonte.
Oportunidade
O cacique da aldeia Brejo Mata Fome, Domingos Nunes de Oliveira, destaca que a ida do Poder Público à comunidade é um diferencial da ação. “Muitas vezes a gente fica sem esse acesso. Ter que se deslocar daqui para outro lugar ou sair para uma cidade distante dificulta muito para a população. Então, essa parceria com o Tribunal de Justiça e as demais instituições tem sido de grande valia para o nosso povo xacriabá”, ressaltou.

O cacique Domingos afirmou que seria importante intensificar o planejamento e a execução dessas iniciativas, em função da necessidade de outros documentos. “A identidade é uma das principais demandas no território, uma das prioridades. Todo documento é necessário para a população, mas a identidade facilita para resolver problemas de saúde e benefícios sociais. O nosso povo, a juventude, os adolescentes precisam do documento”, disse.
Segundo a presidente da Associação Indígena Xacriabá Riacho dos Buritis e Adjacências, Marinete Pereira de Oliveira, de 37 anos, ao promover a cidadania e a autonomia, a proposta está em consonância com os propósitos da entidade para o desenvolvimento de diversos projetos na comunidade, que se fundamentam sobretudo na área ambiental e na preservação da cultura xacriabá. A Aixarba reúne em torno de 30 aldeias e mais de 400 associados.

“Temos o projeto de cercamento das nascentes e ações que buscam valorizar mais a cultura do povo xacriabá, por exemplo, as oficinas de artesanato para mulheres. Recentemente a gente escreveu o Projeto Memorial Chacriabá, que está em fase de aprovação, nessa mesma linha, de preservação, recuperação e manutenção da cultura do povo no xacriabá. Os alunos fazem pesquisa, entrevistamos os mais velhos. A ideia é criar um espaço, na associação, para deixar tudo registrado, colocar ali tudo que é produzido na cultura aqui da região”, salientou.
Evolução
Maria Aparecida Barros Andrade é diretora da Escola Estadual Xukurank, que significa “Boa Esperança”. Atualmente, a unidade é uma das 11 escolas no território xacriabá e oferece desde o ensino fundamental até o médio e EJA. A gestora escolar de 43 anos integrou a primeira turma de educadores indígenas do País, ainda adolescente, nos anos de 1997, e fez o magistério no Parque Estadual do Rio Doce. Ela participou dos esforços de construção e da consolidação da política da educação indígena, que é sempre feita “caminhando junto com a organização interna e a comunidade”, e que representou, para ela, uma evolução.

“Graças a isso, foi-se desadormecendo toda a vivência tida com os professores não-indígenas. Os caciques, estudiosos da área de educação e agentes públicos começaram a pensar na ideia de se criar este modelo de levar o pessoal para estudar fora, criar a turma de professores e começar a trabalhar. A gente começou dando aula debaixo das árvores, nos barraquinhos. Depois, com a luta da comunidade junto aos caciques e lideranças, fomos encontrando alternativas, estratégias, buscando também construção das escolas. Ainda falta muito, mas estamos avançando”, ressaltou.
Impacto
O corregedor-geral de justiça e presidente eleito do TJMG para o biênio 2024/2026, desembargador Luiz Carlos de Azevedo Corrêa Junior, destacou a sinergia entre as instituições envolvidas na realização do Registre-se e o alto impacto da obtenção do documento no exercício da cidadania.
“Sem a documentação básica, o cidadão e a cidadã estão alijados de seus direitos mínimos. Possuir a certidão de nascimento ou casamento e a carteira de identidade é o primeiro passo para inclusão ou reinclusão dessas pessoas na nossa sociedade. Como na primeira edição, em 2023, a Semana Nacional do Registro Civil - Registre-se! nos mostra que o trabalho em parceria é uma ação importante para garantir o mínimo de cidadania àqueles que mais precisam", afirmou.

A juíza auxiliar da Corregedoria-Geral para os Serviços Notariais e de Registro, Simone Saraiva Abreu Abras, salientou que medidas preparatórias foram tomadas para tentar garantir que a iniciativa atinja o maior número de pessoas com maior eficiência possível. "A organização da segunda edição da Semana Nacional do Registro Civil – Registre-se! exigiu a realização de várias reuniões com nossos parceiros e visitas técnicas aos locais das ações, tudo para garantir o sucesso do evento. Neste ano, o enfoque será a população indígena, os pré-egressos do sistema prisional e a população em situação de rua", disse.
De acordo com a magistrada, a ida do Recivil às aldeias com apoio do TJMG permite que, na semana que vem, as atividades do Instituto de Identificação da Polícia Civil sejam otimizadas e todos os interessados sejam atendidos a contento.
Para o também juiz auxiliar da Corregedoria-Geral para os Serviços Notariais e de Registro, Luís Fernando de Oliveira Benfatti, a cidadania só é plena quando pode ser exercida, o que é propiciado a muitas pessoas por meio de ações como a do Registre-se. "Com esse enfoque, o programa Registre-se vem viabilizar a entrega de certidão de nascimento e carteira de identidade para que a população atendida possa, de fato, exercer seus direitos e, por consequência, exercer sua cidadania", frisou.
A diretora do Recivil, Soraia Boan, reiterou a importância de contemplar a População Indígena na 2ª edição da Semana Registre-se. "Dessa forma, estamos contribundo para que cada indígena assistido possa exercer sua cidadania e ter seus direitos reconhecidos. Apenas a posse da documentação civil básica por cada indivíduo nativo permite que todos tenham acesso aos serviços proporcionados pelo Estado", disse.
Para supervisora do Departamento de Projetos Sociais do Recivil e assistente social Leila Xavier, que participou da ação nas aldeias, o trabalho foi "inspirador". "Durante nossa vivência nas aldeias, pudemos adquirir um pouquinho de conhecimento da riqueza cultural dessas comunidades, compreendendo a importância da documentação civil para essas pessoas que estão em situação de vulnerabilidade social e quilômetros de distância da Cidade. A certidão de nascimento ou casamento representa não apenas o acesso a direitos básicos, mas também a possibilidade de inclusão social e reconhecimento de suas identidades", afirmou.
Arte e cultura
O ceramista Vanginei Leite Silva é um dos expoentes da arte e cultura do povo xacriabá. Nei Xacriabá, como é conhecido, foi professor por 20 anos, até que o reconhecimento artístico começou a impossibilitar a conciliação das duas atividades. Ele se graduou pela Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais, onde também defendeu dissertação de mestrado sobre a cerâmica xacriabá, sob orientação da professora Lúcia Pimentel.
O artista relata que a cerâmica, no passado, fazia parte de tradições mais enraizadas. "Mas a gente passou por um processo longo de enfraquecimento de cultura, de exposição à violência, de invasão do território, e houve uma época em que não quase ninguém mais fazia, as pessoas que sabiam fazer tinham parado”, afirmou.
Ele se lembra de que desde criança via a mãe modelar bichinhos em barro, mas ela não queimava as peças. Ao entrar para a escola, ele foi escolhido para ser professor e atuar na disciplina de artes e cultura, e o barro foi uma opção natural, na qual ele demonstrou aptidão e habilidade. Nos anos seguintes, a experiência adquirida com os mais velhos, o estudo acadêmico, o interesse pela arte, tudo foi contribuindo para que ele avançasse na pesquisa da cerâmica.
Atualmente, a atividade de ensino continua por meio de oficinas, que ele realiza a pedido das comunidades ou mesmo fora das aldeias. Nessas ocasiões ele transmite todo o saber por detrás da técnica. Esse conhecimento vai desde a coleta do barro, que tem de observar a fase da lua e outros aspectos, aos acabamentos das peças, que utilizam uma rocha, denominada toá, para fazer pigmentos. A produção do artista pode ser conhecida pelo Instagram ceramicaindigenaxakriaba.
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