
Grupos sociais violentados e discriminados, há séculos, na sociedade brasileira, têm conquistado o direito à reparação histórica, por meio de iniciativas públicas, para combater a discriminação e promover seu acesso a direitos. Com esse objetivo, o Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania – Cejusc Povos e Comunidades Tradicionais do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) fez reuniões com o povo Maxakali, entre 18 e 21 de fevereiro, com foco no uso consciente e seguro da energia elétrica, nos municípios de Bertópolis, Santa Helena de Minas e Teófilo Otoni.

A partir da identificação de problemas relacionados aos riscos do manuseio incorreto das instalações elétricas, entidades parceiras não apenas realizaram visitas prévias às aldeias, como desenvolveram equipamentos específicos para atender à demanda e treinamento para os indígenas.
Ao acompanhar a comitiva, o 3º vice-presidente do TJMG e coordenador do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec), desembargador Rogério Medeiros, teve a oportunidade de conhecer de perto as demandas e a busca de soluções do Judiciário junto aos indígenas Maxakalis que vivem no Norte de Minas.

“Nós, magistrados, trabalhamos muito com a cabeça, mas o envolvimento com esse trabalho junto aos indígenas muda um pouco esse perfil; a gente passa a trabalhar também com o coração. Na minha gestão, pretendo reforçar ainda mais essa integração”, disse o 3º vice-presidente.
Segundo ele, ouvindo os depoimentos das lideranças indígenas, fica perceptível que a iniciativa do Judiciário de facilitar o acesso à Justiça é um divisor de águas, que traz muitos resultados positivos. “Nós devemos muito às comunidades indígenas. São descendentes dos nossos ancestrais que tanto sofreram e sofrem violência e discriminação, ao longo de mais de 500 anos”, concluiu.

A coordenadora-adjunta do Cejusc Povos e Comunidades Tradicionais, desembargadora Shirley Fenzy Bertão, acompanhou todas as reuniões, ouviu as demandas e participou com as mulheres indígenas dos rituais de abertura dos encontros nas quatro aldeias visitadas.
“Nós fazemos uma escuta ativa em cada comunidade Maxakali; trazemos a Justiça não só por meio da conciliação para a resolução de conflitos e o reconhecimento de união estável, mas também criamos uma rede de atuação com parceiros que contribuem para a promoção de direitos dos povos indígenas. É um Tribunal de Justiça saindo do papel somente de julgar e atuando na área extrajudicial, tendo o exercício da cidadania como foco. Inclusive, o projeto Cidadania, Democracia e Justiça ao Povo Maxakali, ganhamos o prêmio de responsabilidade social do Conselho Nacional de Justiça”, disse.

Da mesma forma, o mentor do projeto premiado, juiz Matheus Moura Matias Miranda, atualmente na Comarca de Caeté, continua atuando no norte de Minas para que o desempenho do poder público atenda, de forma digna, a população indígena. “O projeto completou cinco anos, em janeiro de 2025. Temos conseguido vários parceiros a partir das escutas ativas na realização da Justiça itinerante, que é quando o juiz vai até as populações mais vulneráveis para ouvi-las e inclusive realizar audiências judiciais”, afirmou o magistrado.

O juiz explicou que as demandas por solução que envolvem o Judiciário são atendidas pelo setor de cidadania do Cejusc. Entre elas, estão os pedidos de documentação e orientação jurídica. Já as questões extrajudiciais, são resolvidas por meio de acordos mediados pela Justiça. Para essas demandas, outras instituições têm sido contatadas. “Nessa visita, estamos trabalhando numa demanda específica relacionada ao fornecimento e segurança para lidar com a energia elétrica”, ressaltou.
As iniciativas relacionadas aos Cejuscs, no TJMG, ficam sob a responsabilidade da 3ª Vice-Presidência, por meio da Agin (Assessoria de Gestão da Inovação). O responsável por organizar toda a logística da itinerância dos Cejuscs é o assessor especial da Agin, Diego Ávila, que se desloca com sua equipe por todo o interior de Minas. Ele afirmou que, acompanhando as inciativas do Cejusc Povos e Comunidades Tradicionais, tem visto resultados positivos com as parcerias firmadas pela Justiça para melhorar a qualidade de vida do povo Maxakali.
Nas visitas realizadas este mês, além da parceria com órgãos públicos de abrangência nacional, estadual e municipal, participaram a Cemig (Companhia Energética de Minas Gerais) e o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial). Essas parcerias resultaram na realização de cursos de capacitação, pelo Senai, com o objetivo de treinar a população indígena para lidar, de forma segura, com a energia elétrica evitando acidentes com descargas elétricas.
O Cejusc Povos e Comunidades Tradicionais e as entidades parceiras estiveram nas aldeias Pradinho, no município de Bertópolis; Água Boa Bueno e Água Boa Novas Raízes, no município de Santa Helena de Minas; e Escola Floresta, no município de Teófilo Otoni, para dar continuidade ao projeto “Manejo Seguro de Energia” e à escuta ativa para outras demandas.
Projeto “Manejo Seguro de Energia”
A energia elétrica chegou a várias aldeias dos Maxakalis há alguns anos, mas, como se trata de um povo seminômade, eles abandonavam padrões de energia ou, quando se mudavam para bem perto de um deles, puxavam a energia elétrica de forma insegura. Além disso, faziam consertos na rede de energia de forma precária, muitas vezes, usando arame farpado e sacolinhas plásticas para realizar emendas.

Com essas informações colhidas nas visitas itinerantes da Justiça, a Cemig foi convidada a se tornar um dos parceiros. A instituição identificou então a necessidade de fazer um treinamento com os indígenas. Para isso, foi firmada nova parceria, desta vez com o Senai, que integra a Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg).
Depois de os técnicos do Senai visitarem várias aldeias Maxakalis, sempre com um tradutor da língua local, eles desenvolveram caixas de distribuição de energia com tomadas, de onde saem ligações elétricas para as casas dos indígenas. Por serem portáteis, as caixas de passagem podem ser levadas, nos momentos de transferência da aldeia, de um lugar a outro, o que facilita e dá segurança para novas instalações sempre que ocorre o pedido de instalação de um novo padrão de energia para a Cemig.

Com as visitas, os técnicos também perceberam a necessidade de realização de um curso de treinamento e capacitação para o uso consciente e seguro da energia elétrica. Para isso, os técnicos do Senai adaptaram a linguagem técnica a que estavam acostumados para uma linguagem leiga. Ao final do curso, que é bilíngue, a Cemig fornece materiais para pequenos consertos, como fita isolante, além de lâmpadas econômicas.
Uma cartilha de orientação bilíngue para o uso correto da energia elétrica também está sendo desenvolvida, numa parceria da Cemig com o Senai, junto aos indígenas, que ficaram responsáveis pelas ilustrações e pela tradução do texto para a língua maxakali.

O engenheiro responsável pelo curso, gerente da Unidade de Escolas Móveis do Senai, Elmar Rodrigo Vieira, contou que o sistema foi criado para atender às demandas específicas dos Maxakalis, no âmbito do projeto "Manejo Seguro de Energia". “Tivemos que elaborar algo fácil e seguro para o manejo da energia. Visitamos as aldeias Maxakalis, trocamos todos os cabos e desenvolvemos a capacitação. Tínhamos que mostrar a eles os riscos envolvidos no manuseio de forma incorreta”, afirmou.
Entrevista com o engenheiro, gerente da Unidade de Escolas Móveis do Senai, Elmar Rodrigo Vieira:
Há um ano, o Senai foi convidado pelo TJMG para participar do projeto “Manejo Seguro de Energia”, após a morte de duas pessoas por problemas no manuseio das instalações elétricas. O Senai, por ser escola, ficou encarregado de buscar uma solução para o uso da energia elétrica no interior das aldeias, isto é, do padrão da Cemig para dentro, que é área de responsabilidade do consumidor. Tivemos que elaborar algo fácil e seguro; visitamos quase todas as aldeias Maxakalis, trocamos todos os cabos e desenvolvemos a capacitação, a fim de mostrar a eles os riscos envolvidos no manuseio incorreto das instalações.
Para nós foi um desafio, porque não sabíamos como os indígenas iriam receber a capacitação, se aceitariam usar os equipamentos de proteção individual (EPIs), entre outras questões. Há detalhes que não podiam ser planejados de longe. Então, tivemos que visitar várias vezes as aldeias, conhecendo as peculiaridades de cada uma.
Fizemos um projeto-piloto numa aldeia específica, para depois elaborarmos o curso bilíngue com duração de duas semanas. Na primeira semana, explicamos quem somos e o que estamos fazendo ali. Para nossa surpresa, foi tudo muito tranquilo. Falamos de segurança, de como funciona a energia e mostramos o material que desenvolvemos, de maneira básica e lúdica. Os indígenas se mostraram muito curiosos e interessados em aprender.
Tivemos que conhecer a realidade dos indígenas e estudar para elaborar as instruções que seriam repassadas, simplificando os termos técnicos, de forma a alcançar o objetivo, que era o aprendizado sobre segurança. Percebemos o que poderia ser melhorado e vamos, a partir do projeto-piloto, ampliar a capacitação para todas as aldeias.
O Senai elaborou caixas portáteis de distribuição de energia para a implantação nas aldeias. Já a Cemig, ficou responsável pela compra de todo o material. Para dentro das casas, nós desenvolvemos um quadro de energia com seis tomadas e dois interruptores, um disjuntor e uma proteção para evitar choques elétricos, caso haja fuga de corrente. Os próprios indígenas ficam responsáveis por fazer a instalação e a manutenção das caixas, depois da capacitação.
As caciques e os caciques de todas as aldeias visitadas demonstraram satisfação com a iniciativa da Justiça itinerante de contribuir na solução de questões judiciais e extrajudiciais. “Ficamos muito felizes em receber a itinerância da Justiça, principalmente por reconhecerem as nossas diferenças. O povo Maxakali esteve, por muito tempo, abandonado. E o juiz Matheus Miranda teve essa visão diferenciada pra nosso povo, zelando pela preservação da nossa língua, nossos cantos e nossas tradições. O projeto da energia é muito importante para nós”, disse a cacique Sueli Maxakali.

“Nosso objetivo é garantir que todos tenham acesso a um fornecimento de energia seguro e eficiente, respeitando as particularidades culturais e sociais do povo Maxakali. A cooperação entre os órgãos públicos é fundamental para alcançar soluções que melhorem as condições de vida e segurança dessas comunidades”, afirmou o advogado da Vice-Presidência Jurídica da Cemig, Gustavo Marchini, sempre presente nas visitas às aldeias.

Desde que começou, há cinco anos, o projeto conta com o apoio e a parceira da Funai (Fundação Nacional do Índio) e do Ministério da Saúde, por meio da Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena) e do Disei (Distrito Sanitário Especial de Saúde Indígena). O coordenador do Disei, Célio Cezar Ferreira, disse que a parceria com a Justiça tem sido benéfica para as aldeias na busca de soluções para problemas enfrentados pelos indígenas.
“O protagonismo do Judiciário tem contribuído para desenvolver ações mais integradas com órgãos federais, estaduais e municipais. Nas reuniões, os indígenas discutem as questões que enfrentam, relatam os conflitos e descrevem os problemas de saúde, como o alcoolismo e a urgência para realização de cirurgias”, observou o coordenador do Disei.

Também estiveram presentes nas visitas deste mês o juiz auxiliar da 3ª Vice-Presidência, José Ricardo dos Santos de Freitas Véras; o juiz da Comarca de Araçuaí cooperando em Águas Formosas, Emílio Guimarães Moura Neto; a vice-prefeita de Águas Formosas, Margarida Maxakali; e representantes das seguintes instituições: Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais, Tribunal de Contas de Minas Gerais, Ministério Público Federal, Ministério Público de Minas Gerais, Defensoria Pública da União, Defensoria Pública de Minas Gerais, Polícia Civil, Secretaria de Estado da Saúde, Secretaria Municipal de Assistência Social e Habitação de Teófilo Otoni, Universidade Federal do Sul da Bahia (UFSB), Universidade do Vale do Rio Doce (Univale) e Caixa Econômica Federal, que tratou do projeto “Minha Casa, Minha Vida”.

Veja outras imagens do Projeto nas comunidades indígenas de Pradinho, de Água Boa e da Escola Floresta.
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