Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais

Prefeito e ONG de Serrania condenados por improbidade administrativa

Repasses irregulares para ONG causaram prejuízo de mais de R$ 100 mil ao município


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Vista de Serrania: ex-prefeito foi condenado por usar ilegalmente recursos aprovados para ONG

O ex-prefeito de Serrania (MG) Salvador Rodrigues Moreira e a Assistência Social Liberdade e Vida (Aslivi) foram condenados a ressarcir ao erário municipal o montante de R$ 114.990, além de pagar multa civil equivalente ao dobro do valor do dano apurado. O caso foi julgado em primeira instância pelo juiz Nelson Marques da Silva, da 1ª Vara Cível de Alfenas. 

De acordo com a ação civil de improbidade administrativa movida pelo Ministério Público, Salvador Rodrigues Moreira foi um dos fundadores da ONG Aslivi, em 1993, associação que angariava verbas junto à comunidade para financiar atividades de caráter filantrópico, social, cultural, entre outros. O ex-prefeito foi eleito para dois mandatos consecutivos, de 2005 a 2012.

Sucessivos convênios

De acordo com o MP, a Aslivi estava com suas atividades suspensas por carência de recursos financeiros até 2007, quando passou a receber dinheiro público “em razão de uma série de contínuos e sucessivos convênios firmados com o Município de Serrania” até o encerramento do último mandato de Salvador, em 2012.

O MP denunciou ainda que, enquanto prefeito, Salvador Rodrigues também participava e dirigia as atividades da instituição, por meio da indicação de pessoas de sua confiança para a diretoria. Algumas ocuparam cargos comissionados no Executivo durante os mandatos do ex-prefeito.

O MP destacou a participação de indicados do então prefeito na ONG, como a presidente Benilda Aparecida, a vice-presidente Aparecida de Cássia, a vice-tesoureira Maria Gasparina e o membro do Conselho Fiscal Douglas Moreira Dias, o que permitia ao acusado controlar os destinos da entidade e dos repasses efetuados a ela.

Aparência de legalidade

Ainda segundo o MP, para viabilizar o recebimento de verbas públicas pela entidade, o próprio Salvador Rodrigues, em fevereiro de 2007, quando já era prefeito, tratou pessoalmente de regularizar a situação da Aslivi, inclusive com o registro de ata de reunião no Cartório de Registro de Pessoas Jurídicas de Alfenas (MG).

Também no âmbito do município, segundo o MP, o ex-prefeito praticou atos administrativos para dar aparência de legalidade aos repasses das subvenções, tendo inclusive editado a lei municipal que declarou a Aslivi como entidade de utilidade pública, em 15 de outubro de 2007.

Em 2010, ele providenciou requerimento de registro do estatuto social, assinado por ele e rubricado em todas as folhas pelo assessor jurídico do Município de Serrania, Gilcimar Gomes, utilizando-se dos servidores do Executivo para atingir interesses da Asliv.

 

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Em vez de aplicar verba do Poder Público em creche, ex-administrador comprou imóvel e carro

Para efetivar as irregularidades, segundo o MP, foi firmado um convênio com a entidade, visando implementação de ações de assistência a crianças carentes no município por meio de programas socioeducativos desenvolvidos pela ONG, com previsão de repasse de subvenção de até R$ 80 mil.

Segundo o MP, no entanto, o objeto não foi cumprido, e o valor foi utilizado irregularmente para adquirir dois imóveis onde funcionava a sede da Aslivi, no valor de R$ 58 mil.

Assim, o convênio somente serviu para formalizar o repasse de verbas públicas à ONG, viabilizando a constituição do patrimônio imobiliário adquirido com dinheiro público. Esse imóvel foi posteriormente cedido ao Executivo Municipal em março de 2008 para funcionamento de creche e pré-escola, com custos ao Município de Serrania.

Para o MP, os convênios firmados não correspondiam à realidade e jamais foram cumpridos pela entidade conveniada. As atividades da ONG eram custeadas diretamente pelos cofres públicos e dirigidas pelo Executivo, em subordinação à Secretaria de Educação e demais estruturas administrativas da prefeitura, havendo confusão entre poder público e entidade privada.

Os gastos justificados pela Aslivi — entre estes leite, contador, contas de água e luz, materiais de construção e serviços de pedreiro, despesas de um grupo de terceira idade coordenado pela esposa do então prefeito — não deveriam ser custeados com as verbas do convênio.

O MP ainda acusou o ex-prefeito de, no término de seu segundo mandato, em dezembro de 2012, liberar uma subvenção de R$ 25 mil para a ONG. O recurso foi destinado à compra de um Fiat Palio 1.0 em nome da Aslivi, mas o veículo foi utilizado por Salvador e sua esposa após o fim do mandato. O bem foi vendido posteriormente, mas o dinheiro não foi depositado em nome da associação.

Além disso, as atividades da entidade foram paralisadas após o encerramento das subvenções do município, que eram viabilizadas por Salvador.

Defesa

Os acusados alegaram que não cometeram atos de improbidade e que os convênios firmados entre o Município de Serrania e a Aslivi entre 2007 e 2012 foram realizados com observância da Lei de Diretrizes Orçamentárias.

Também alegaram que a Câmara Municipal dispensou a análise dos convênios sob observância de mera ciência da assinatura dos aludidos convênios para fins de fiscalização contábil, financeria e orçamentária. Disseram ainda que todos os atos foram transparentes e publicados no Diário Oficial e que a Aslivi prestou contas de seus gastos.

Ainda de acordo com eles, a Aslivi continuou a usar o prédio cedido como creche à prefeitura porque as atividades da ONG eram realizadas no período noturno; e as escolares, durante o dia.

Fora do objetivo

Ao analisar o processo, o juiz observou que há previsão legal para a celebração de convênios entre entidades privadas e públicas, para fins de cooperação mútua, com recebimento de valores. Mas essas verbas não perdem a natureza de dinheiro público e só podem ser aplicadas para os fins previstos no convênio. 

Por meio dos documentos apresentados e dos depoimentos dos próprios acusados e também de testemunhas, o juiz concluiu que não se observou o princípio da cooperação mútua para alcançar interesses comuns e que a requerida se afastou do objeto pactuado e dos planos de trabalho.

“Eis que não houve, de fato, a descentralização na prestação dos serviços de assistência social à criança e educação através da implementação da creche por ela”, afirmou.

 

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Fórum de Alfenas: juiz da 1ª Vara Cível da comarca, Nelson Marques da Silva, sentenciou Salvador Rodrigues ao ressarcimento de verba aos cofres públicos

Os próprios envolvidos justificaram as ações sob o argumento de que a creche era um “trabalho originário do Poder Executivo Municipal”, sem qualquer vínculo com a Aslivi, e que, por essa razão, era custeada pelo município. Mas ficou comprovado que a referida atividade foi transferida à entidade por meio de convênio, e que o custeio da creche é que justificava o repasse de subvenções à ONG.

O juiz Nelson Marques da Silva destacou que não deveria haver tal separação de atividades, porque os convênios visavam justamente o contrário, ou seja, somar forças entre o poder público e o particular em prol do interesse comum, deixando claro que as subvenções não se destinaram ao fim previamente delimitado nos planos de trabalho.

Os depoimentos de Salvador Rodrigues Moreira, segundo o juiz, confirmaram não só as irregularidades em relação ao convênio como também a utilização da verba para a compra do veículo, e o desvio do valor de sua venda posteriormente.

Assim, o juiz concluiu que, “se não houve um dolo direto, ainda que indiretamente houve a assunção de um resultado lesivo aos cofres públicos, visando ao bem maior da própria associação e não da coletividade”.

O MP solicitou o ressarcimento de R$ 194.990 ao erário. De acordo com o juiz, no entanto, o órgão não apresentou cálculos ou elucidou como chegou ao referido montante, por isso considerou o total de R$ 114.990, especificado em quadro demonstrativo anexado ao pedido inicial, como o valor a ser devolvido.

Além do ressarcimento ao erário e da multa civil aplicada, o juiz determinou a proibição de os acusados firmarem contratos com o poder público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual sejam sócios majoritários, pelo prazo de três anos, considerando que eles abusaram desse direito.

A acão tramitou eletronicamente sob o número 5002381-15.2017.8.13.0016.

 

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