Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais

Escritora Nélida Piñon reflete sobre o feminino na criação

Videoconferência integrou ciclo de lives da Ejef, reunindo mulheres que inspiram


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Nélida Pinõn publicou mais de 25 livros, tem obras traduzidas para diversos idiomas e recebeu vários prêmios em sua trajetória

 

“Não acredito em literatura feminina. E nem quero literatura feminista — e sou uma feminista histórica, apaixonada desde sempre. Mas a literatura é um compromisso com o descompromisso; ela não se devota, não favorece homens e mulheres. Há uma voz narrativa que é do escritor, uma voz que tem todos os sexos do mundo (...). Uma voz universal, a partir da qual você tem condições de captar as condições de cada gênero, de cada época.”

Essas foram algumas das reflexões com as quais a escritora e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) Nélida Piñon brindou os participantes do encontro “A mulher na criação: a escritora que sou”, que reuniu na manhã desta segunda-feira (14/9) magistrados, assessores, assistentes de gabinete, servidores, estagiários do TJMG e a comunidade externa. 

A atividade à distância, com transmissão ao vivo pela internet, integrou o 1º Ciclo de Lives “Mulheres que inspiram pessoas e que superam os desafios da atualidade”, realizado pela Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef) do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). 

Os trabalhos foram abertos pelo 2º vice-presidente do TJMG e superintendente da Ejef, desembargador Tiago Pinto, que ressaltou a alegria e a honra de a atividade contar com a participação de uma das mais destacadas escritoras brasileiras. A apresentação da expositora, com a leitura de um suscinto currículo da convidada, coube à desembargadora Mariangela Meyer, superintendente adjunta da escola judicial.   

Rica trajetória 

“Nélida Pinõn publicou mais de 25 livros, e suas obras foram traduzidas em mais de 30 países, contemplando romances, contos, ensaios, discursos, crônicas e memórias”, destacou a desembargadora, acrescentando ainda que a escritora recebeu o título de doutor honoris causa em diferentes países e foi professora visitante em universidades estrangeiras, entre várias outras conquistas.

Ao apresentar Nélida Pinõn, a desembargadora Mariangela Meyer lembrou também, entre outros pontos, que a escritora ganhou ao longo de sua carreira inúmeros prêmios nacionais e internacionais, entre eles, o prestigiado prêmio Príncipe de Astúrias de Letras, que conquistou em 2005. Em 1996, ela se tornou a primeira mulher, em 100 anos, a presidir a Academia Brasileira de Letras, no ano de seu primeiro centenário.

A mediação dos trabalhos coube à juíza do Tribunal de Justiça Militar de Minas Gerais (TJMMG) Daniela Marques, que é professora doutora da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “Este é um momento de grande emoção, pois meus ídolos sempre foram os escritores. Fui trocando de paixões e amando cada vez mais os livros, a palavra e os escritores que repartem sua alma conosco”, disse.

Com uma fala emocionada, a professora e juíza Daniela Marques, antes de passar a palavra à palestrante, compartilhou ainda com o público como foi seu contato com a obra de Nélida Piñon, contando que o primeiro livro que leu da escritora foi “A República dos Sonhos”, que lhe pareceu um “labirinto de palavras” de grande beleza. O último foi “Uma Furtiva Lágrima”, com o qual teve grande identificação. 

Ouça o podcast com o áudio da escritora Nélida Pinõn:

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Os trabalhos foram abertos pelo 2º vice-presidente do TJMG e superintendente da Ejef, desembargador Tiago Pinto

Cidadã do mundo 

Ao iniciar sua exposição, Nélida Piñon disse que revelaria algumas coisas que estavam tocando seu coração. “Eu vim de longe, muito longe. Sou de uma família de imigrantes, portanto, trago comigo as travessias atlânticas, marítimas. Eu poderia ser Ulisses, mas quem fez essa viagem inaugural foram meus avós e meu pai, que me legaram esse espírito de aventura, esse sentimento de que eu não comecei neles”, disse.

Contando como esse aspecto de sua biografia foi decisivo em sua trajetória, a escritora disse que, ao se dar conta de sua origem familiar, sentiu-se liberada para “visitar o mundo”. “Entendi que essa imigração não era um fato comum na minha vida, mas que ele abria as comportas da sensibilidade, afinando-a para que eu fosse uma mente que entendia que a cultura e os pilares civilizatórios não começaram naquela localidade específica onde eu nasci”, afirmou. 

Sobre sua infância e sua formação intelectual, que foram aos poucos forjando a escritora que ela seria, Nélida Piñon contou que teve uma educação privilegiada. “Meu pai era um grande leitor e foi ele quem me apresentou Machado de Assis. Eu tinha conta aberta em livraria”, disse, revelando que nenhuma leitura era proibida, e que isso permitiu que ela fosse alargando seus horizontes “sem cautela”.

Além da literatura, ela disse que teve acesso amplo a óperas, balés e teatros, e que aos 10 anos foi levada para a Espanha. “O tempo que lá fiquei corroborou para meu entendimento de que ninguém é de um só país, de um só tempo, de um só século”. Outro aspecto marcante desse período foi a percepção de que os galegos têm grande capacidade de fabular a realidade. “Nessa Galícia, aprendi a exercitar em abundância a imaginação”, afirmou. 

Entre outros pontos, a escritora lembrou ainda que estudou em colégio alemão, que era apaixonada por Lutero e que por volta dos 14 anos leu Dostoiévski e ficou fascinada. “Tudo isso são os fundamentos de uma menina que vai ser a mulher que é hoje, a escritora que sabe que, para escrever, você não pode ser alguém da instância recente. O mundo de hoje não me interessa por ele só; interessa se ele vem calcado em todas as instâncias, em todas as arqueologias que nos precederam no tempo”, declarou.

Além de falar sobre sua paixão pela leitura e pelas artes em geral, e do desejo que acalentou de ser escritora, desde menina, ela contou também sobre alguns dos grandes escritores que conheceu, destacando a amizade com Clarice Lispector e Mario Vargas Llosa. Falou também sobre o papel fundamental da música e das viagens em sua criação e sobre o grande escritor que foi Machado de Assis. 

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A mediação dos trabalhos coube à juíza do TJMMG Daniela Marques, que é professora doutora da Faculdade de Direito da UFMG

Livro como alforria      

Depois de discorrer sobre outros aspectos do seu trabalho como escritora e de responder a perguntas dos participantes da live, ela deixou um recado para os jovens. “Que eles compreendam que, quando nós lutamos para que eles entendam o valor estético, histórico e moral da cultura e da cultura livresca, não é uma voz anacrônica, uma voz superada nos tempos modernos”, disse.

E continuou: “Os tempos modernos estão precários, não entendem o que está acontecendo neste momento. Veja a pandemia: ninguém explica para onde estamos indo e como podemos dar solução aos nossos problemas — explosão demográfica, refugiados, imigrações, polarizações, radicalizações (...)”. 

Para a escritora, o que ainda pode fazer com que a humanidade tome um rumo “mais generoso, mais adequado, mais paciente, mais capaz de dialogar uns com os outros” é o livro. “Peço aos jovens que descubram o prazer da leitura, o que significa ter um livro na mão. O livro alforria uma pessoa: você deixa de ser escravo dos seus instintos e da sua pobreza intelectual para ser um ser livre, libertário, audacioso; ele afugenta as negligências, as mediocridades do cotidiano”. 

Concluindo, e escritora declarou: “O cotidiano é muito modesto. Você só dá grandeza a ele saindo dos seus limites, quando você pensa, quando excede e extrapola, quando faz uso da imaginação. E a imaginação, não se iludam: nós nascemos com ela pequenininha; para que ela cresça, você precisa preenchê-la com pão: o pão do espírito, o pão da palavra, o pão do livro”. 

Presenças 

A abertura da atividade contou ainda com a presença do desembargador José Fernandes Filho, ex-presidente do TJMG; do desembargador Rogério Medeiros, ex-presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE-MG); do presidente da Academia Mineira de Letras (AML), Rogério Faria Tavares; da diretora executiva da Ejef, Thelma Regina Cardoso; da diretora executiva da Gestão de Bens, Serviços e Patrimônio, Adriana Lage; e da gerente de Formação da escola judicial, Lorena Belleza.

Assista a live na íntegra.

 

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