
“Queremos agradecer a mobilização de vocês, que são pessoas sensíveis. Mas há muitos insensíveis por aí e, enquanto a população de rua aumenta, as políticas públicas voltadas para esse público diminuem. Essa é uma população invisível, por isso é muito bom perceber que existem pessoas que as enxergam com outro olhar. Que vocês se tornem multiplicadores.”
A manifestação, do ex-morador de rua Rafael Roberto Fonseca da Silva, integrante do Movimento Nacional da População em Situação de Rua (PSR), foi dirigida a um grupo de representantes do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) que esteve na manhã desta sexta-feira, 5 de julho, na Pastoral de Rua da Arquidiocese de Belo Horizonte, para a entrega de cobertores da campanha “O inverno não é tão frio quando existe solidariedade”.

Um total de 565 cobertores foi arrecadado durante a iniciativa, realizada pelo Judiciário estadual por meio de seu Núcleo de Voluntariado. A entrega de parte dessa doação aconteceu durante uma roda de conversa que reuniu integrantes de movimentos em prol da PSR, voluntários, magistrados e servidores do Tribunal mineiro e pessoas que, no momento, enfrentam a realidade de não ter um teto sob o qual viver.
A desembargadora Maria Luíza de Marilac, presidente do Núcleo de Voluntariado, manifestou a alegria de participar daquele momento. “A solidariedade é o sentimento que melhor expressa o respeito à dignidade da pessoa humana. Esta campanha é um gesto de solidariedade emergencial, em uma tentativa de aplacar um pouco o sofrimento pelo qual passam as pessoas que vivem nas ruas”, disse.
Para a magistrada, mais do que a questão material, o que se busca com a doação dos cobertores é aproximar o Judiciário mineiro dessa realidade. “É importante dar voz a essas pessoas, acolhê-las. O que ouvimos aqui, hoje, foi muito importante para entender como podemos contribuir mais. Precisamos ouvir o outro e nos colocar no lugar dele”, ressaltou.

Combate à invisibilidade
O juiz Sérgio Henrique Cordeiro Caldas Fernandes, da 23ª Vara Cível da Comarca de Belo Horizonte, e também membro do Núcleo de Voluntariado, observou que “a realidade das pessoas em situação de rua é multifacetada”. Assim, uma forma de se enfrentar essa realidade é por meio “do combate à invisibilidade”.
Na avaliação do magistrado, o gesto de ajudar quem está sofrendo nas ruas é importante, em especial nesta época do ano, em que os termômetros registram as mais baixas temperaturas. “Para nós, pode ser algo distante, mas um cobertor pode significar a diferença entra a vida e a morte para uma pessoa em situação de rua”, disse.
Mas, para além dessa ajuda pontual, o juiz destacou a importância da mobilização voluntária e solidária dos membros do Tribunal de Justiça em torno do tema. “Conhecer essa realidade é a melhor forma de tentar trabalhar esse cenário, a fim de modificá-lo”, declarou.
Também presente durante a entrega das doações, a juíza Cláudia Helena Batista, da 1ª Vara Empresarial da capital, integra o programa Rua do Respeito, assim como o juiz Sérgio Fernandes. O Rua do Respeito visa a dar efetividade a políticas públicas e ações sociais voltadas para a população de rua e reúne, além do TJMG, diversos outros parceiros.
Durante a roda de conversa, a juíza afirmou que é preciso uma mudança de cultura, para que a sociedade se sensibilize com essa causa – um movimento de quebra de resistência que envolve também o Judiciário mineiro. “Esse é um processo que leva tempo, porque há uma distância entre o que desejamos realizar e o que efetivamente conseguimos”, frisou.
A servidora da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef) do TJMG, Mônica Sá, acrescentou que o cobertor não resolve a complexidade dos problemas enfrentados pela população em situação de rua, mas ajuda a minimizar o desconforto do frio nesta época do ano.

Desafios e esperança
Rafael da Silva, cuja fala abre esta matéria, viveu 12 anos nas ruas. Hoje, além de hoje atuar tentando resgatar a vida de outras pessoas que vivem essa realidade, ele integra o conselho municipal de segurança alimentar e nutricional da capital, tem moradia própria e conseguiu reatar laços familiares desfeitos durante a trajetória nas ruas.
Aos representantes do Tribunal mineiro, ele relatou dois dos principais desafios com que esse público atualmente se depara: a retirada de seus pertences por agentes da Prefeitura de Belo Horizonte e a falta de acesso ao restaurante popular nos feriados e finais de semana.
“A questão do recolhimento dos pertences é muito grave, pois é uma agressão moral, muitas vezes acompanhada da agressão física. Quem está nas ruas já vive uma situação fragilizada e, de repente, se vê sem cobertores e documentos, seus únicos bens. E há uma decisão do TJMG proibindo a apreensão dos pertences, sob pena de multa”, afirma.
Entre outros pontos, ele comentou que o aumento do desemprego está levando mais pessoas para as ruas, e o que número de mulheres nessa situação está crescendo. “Mas há apenas um abrigo para elas, que vivem ainda o drama de verem seus filhos retirados, por causa da realidade em que se encontram”, contou.

Depois de viver 13 anos nas ruas, Samuel Rodrigues, também integrante do Movimento Nacional de População em Situação de Rua, destacou o aumento das agressões contra moradores de rua. “É tenso viver nas ruas, as pessoas têm medo. De janeiro a junho, foram registrados 23 casos de violência; no mesmo período, neste ano, já foram 53 casos, um aumento de mais de 100%”, indicou.
Além de pedir apoio do Judiciário mineiro para a questão, Samuel declarou que a campanha do TJMG é uma demonstração de solidariedade “que soma muito” para quem está na rua, desprovido de tudo. “Em pleno inverno, a pessoa está entregue ao relento, vivendo uma cidade que tem apenas mil vagas de acolhimento e um número muito maior de pessoas na rua. O cobertor faz toda a diferença neste momento”, concluiu.
Ouça o podcast com as entrevistas:
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