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22/11/17 11:06

 

Dois irmãos que não se falavam, nove processos na Justiça comum e mais dois processos no Juizado Especial Cível de Belo Horizonte que versavam sobre questões financeiras. Essa história terminou numa sessão de conciliação onde eles se perdoaram e se abraçaram. Quem conta é a conciliadora e coordenadora da Central de Conciliação Denise Araújo Souza.

Um dos irmãos é empresário, o outro era funcionário do empresário e eles brigavam judicialmente por questões financeiras até que, numa sessão de conciliação, Denise percebeu que o motivo principal do conflito não era o dinheiro, mas as relações familiares muito desgastadas. Os irmãos nem sequer se olharam durante a primeira sessão. O irmão funcionário achava que deveria ser melhor remunerado pelo irmão, e este gostaria de ser reconhecido pelos pais por ajudar o irmão. "Quando eles se colocaram um no lugar do outro, se distanciando do conflito, e vislumbraram o interesse do outro, eles se perdoaram e se reconciliaram, lembrou Denise. O termo final da conciliação, assinado pelo juiz Eduardo Gomes dos Reis, versou sobre o pedido de desistência de todos os processos, inclusive os da Justiça comum.

Casos como esse enchem de satisfação os conciliadores, que trabalham para ajudar as partes a chegar a um acordo. De questões familiares a financeiras, insatisfações com serviços ou produtos, as mais variadas questões podem ser resolvidas em sessões de conciliação

O MÉTODO DA CONCILIAÇÃO

A conciliação é um método utilizado principalmente para conflitos em que as partes não têm convivência. Ele é muito eficaz nas relações de consumo e nos crimes de menor potencial ofensivo. O conciliador busca harmonizar o conflito para que as pessoas envolvidas cheguem a um acordo pacífico que compatibilize os interesses e as necessidades de ambas, geralmente em uma única sessão.

Para os conflitos que surgem a partir de relações interpessoais complexas e continuadas, como entre familiares, vizinhos, ou mesmo entre empresas e vizinhança, o método de resolução de conflitos indicado é a mediação. O mediador facilita o diálogo, em quantas sessões forem necessárias, para que as partes possam construir juntas uma boa solução para o problema.

 

Na área criminal, a autocomposição pode acontecer também por meio da justiça restaurativa, um processo colaborativo que envolve a participação ativa do ofensor, da vítima e de outras pessoas envolvidas no conflito. As sessões acontecem em ambiente guardado de segurança jurídica e física, com o objetivo de buscar um acordo para a resolução de outras dimensões do problema que não apenas a punitiva, por exemplo, a reparação de danos emocionais. O agente deve reconhecer seu erro e assumir a responsabilidade pelas consequências de seu ato. A justiça restaurativa pode ser empregada em crimes de menor ou de maior potencial ofensivo e não descarta o cumprimento da pena.

Todas as técnicas são norteadas por princípios como informalidade, simplicidade, economia processual, celeridade, oralidade e flexibilidade processual. Os mediadores e conciliadores atuam de acordo com os princípios fundamentais estabelecidos na Resolução 125/2010 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ): confidencialidade, decisão informada, competência, imparcialidade, independência e autonomia, respeito à ordem pública e às leis vigentes, empoderamento e validação.

 

Em junho de 2011, o TJMG criou o Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec), coordenado pela 3ª Vice-Presidência. O núcleo foi criado para desenvolver em Minas Gerais a política judiciária de tratamento adequado dos conflitos de interesses, conforme estabelecida pela Resolução 125/2010 do CNJ.

O Nupemec planeja, implementa e aperfeiçoa as ações voltadas ao cumprimento da política de solução de conflitos, realiza cursos e seminários sobre mediação e conciliação e outros métodos consensuais de solução de conflitos.

Cabe ainda ao núcleo criar, em todas as comarcas do estado, os Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc), que têm como objetivo resolver os conflitos por meio de sessões de conciliação e mediação. No Cejusc, o juiz somente dará uma sentença se as partes não conseguirem chegar a um acordo.

No link Quero Conciliar, disponível no Portal do TJMG, o jurisdicionado encontra as possibilidades para resolver seu conflito em Minas, entre elas: Juizado Especial Cível, Juizado Especial Criminal e Cejusc. Para a realização das conciliações pré-processuais nos Cejuscs, o TJMG tem parcerias com entidades públicas e privadas, instituições de ensino superior, associações comerciais e empresas.

Todas as formas de conciliação preconizam que as partes interessadas encontrem soluções pacíficas e menos burocráticas para resolver os seus conflitos, com o auxílio de conciliadores ou mediadores. A proposta é disseminar a cultura da pacificação social.

Veja a opinião do 3º vice-presidente do TJMG, desembargador Saulo Versiani Penna.

 

Juizado Especial Cível e da Fazenda Pública de Belo Horizonte

O juizado realiza uma média de 8 mil audiências por mês, aproximadamente 400 audiências diariamente, e atua nos seguintes conflitos: relações de consumo, telefonia e residual (outros conflitos que envolvam pessoas físicas e jurídicas), microempresa, acidente de trânsito (área cível) e fazenda pública (ações contra o Estado).

Christiane Britto trabalha na conciliação do juizado há cinco anos e lembra que a maioria das pessoas tem boa vontade para buscar um acordo. "Às vezes saio de uma sessão com o coração doendo, pois as pessoas querem pagar suas dívidas, honrar seus nomes, mas muitas vezes sabem que não vão conseguir o dinheiro necessário", disse a conciliadora.

Os irmãos Agnaldo e Elizabeth tinham um débito de aluguel de R$6,6 mil e conseguiram negociar com o proprietário para pagar a dívida em 22 parcelas de R$300. "Estou há um mês sem dormir, desde que recebi a citação. Eu não sei dever e não posso deixar meu nome sujo. Estou saindo muito satisfeita com o resultado da negociação, pois somos inquilinos do mesmo proprietário há anos e sempre tentamos pagar em dia", disse Elizabeth.

Coordenador do juizado, o juiz Francisco Ricardo Sales Costa afirma que "o processo é um desencontro, enquanto a conciliação é um encontro com o auxílio de um conciliador". O juiz lembra que, se as partes não chegarem a um acordo, a conciliação é convertida em audiência, e o processo segue até a decisão de um magistrado.

 

O juiz Marcelo Pereira da Silva atua no Juizado Especial Cível de Belo Horizonte e, quando as partes não chegam a um acordo numa sessão de conciliação, ele prioriza a prolação da sentença imediatamente. "Gosto de trabalhar conversando com as partes. Reviso os termos de acordos redigidos pelos conciliadores e, no caso de não haver acordo, não prolato a sentença na hora, somente se a causa for mais complexa", diz. Ele lembra que a conciliação é um trabalho de equipe cujo intuito é deixar as partes resolverem seus próprios conflitos. Para ele, a sentença de um juiz é a última opção.

O caso de um cachorro e os ex-namorados. Ouça a história, contada pelo juiz Marcelo.

A consumidora Luciana Costa teve problemas com os serviços de um pacote de telefonia, internet e TV, mas não foi possível o acordo com a operadora na sessão de conciliação. Então, o juiz Marcelo Pereira da Silva decidiu a favor da consumidora, e o advogado dela comemorou: "É a primeira vez que vejo um juiz dando a sentença na própria sessão de conciliação. Acho excelente a iniciativa, porque essa é a melhor forma de cumprir o propósito para o qual os juizados foram criados, que é a celeridade".

Juizado Especial Criminal de Belo Horizonte – Setor de Conciliação

O Juizado Especial Criminal é competente para conciliar e julgar infrações penais de menor gravidade contravenções e crimes com pena máxima não superior a dois anos, tais como lesão corporal leve, ameaça, injúria, calúnia, difamação, embriaguez ao volante, ato obsceno, falsidade de atestado médico, lesão corporal culposa, omissão de socorro, apreensão de aves, poda ou corte ilegal de árvores, consumo de drogas, jogos ilegais, entre outras.

Para tentar a sorte, ela estava em um jogo de azar. Deu azar: a Polícia Civil atuou em um flagrante. Dona Maria (nome fictício), 65 anos, que estava ali pela segunda vez na vida, teve que apresentar seus documentos e foi intimada a comparecer ao Juizado Especial Criminal de Belo Horizonte. Na primeira audiência de conciliação, ficou acordado que ela pagaria uma pena pecuniária no valor de R$480, dividida em três parcelas de R$160.

Depois de pagar a primeira, ela descobriu uma doença grave, e seu dinheiro teve de ser direcionado para comprar os remédios não fornecidos pelo sistema público. Então, Dona Maria recebeu outra intimação, e seu marido quase descobre o problema, não fosse a chegada providencial da vizinha. "Eu sou católica, sabe, e a imagem da santinha fica lá em casa, durante três dias, todo final de mês. A vizinha chegou, levando a imagem da Nossa Senhora das Graças para mim, assim que o oficial de justiça saiu. Meu marido perguntou quem era e eu disse que era a santinha chegando." Ela foi "salva" pela santinha e graças ao atendimento na segunda sessão de conciliação que abateu uma parcela da dívida, vai conseguir quitá-la mais rapidamente. Dona Maria se comprometeu a pagar a segunda e última parcela com o seu 13º salário. "Eu vou pagar logo para ficar livre desse problema. Ai, que vergonha de estar aqui! Deus que me perdoe, nunca mais", desabafou.

Um gato e uma calopsita acabaram levando suas donas ao Juizado Especial Criminal. As duas vizinhas se davam muito bem até que o gato matou a calopsita da neta da outra, que ficou muito triste. Depois do episódio, elas passaram a trocar farpas, até que na audiência de conciliação fizeram as pazes, e a dona do gato se comprometeu a pagar o valor da calopsita. "Esse é um exemplo de cultura da paz, em que as partes conseguem dialogar e voltar a conviver em harmonia", disse a psicóloga e conciliadora Rosymar Souza Neves.

Seja nas relações da vida pública, seja nas da vida privada, a conciliação tem resolvido questões e trazido paz para as pessoas. A coordenadora do Juizado Especial Criminal de Belo Horizonte, juíza Flávia Birchal, acredita na metodologia. "É uma mudança de cultura, as audiências de conciliação ensinam as pessoas a aprender a conversar e a resolver os problemas de forma pacífica", disse.

 

Na audiência preliminar, é oferecida às partes a oportunidade de se conciliarem mediante acordo. O conciliador, juntamente com o juiz, procura fazer com que a parte ofensora repare os danos sofridos pela vítima e aplica sanções não privativas de liberdade, como penas pecuniárias ou prestação de serviços à comunidade. Não sendo aceita a transação penal, o processo segue com a audiência de instrução e julgamento (AIJ) até a prolação da sentença por um magistrado, quando o réu poderá ser absolvido ou condenado.

Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) de Belo Horizonte

O Cejusc atua nos setores pré-processual, processual e de cidadania. O setor de cidadania fornece as informações para que o cidadão possa utilizar os serviços do Judiciário. O setor pré-processual tenta resolver as controvérsias antes que elas se transformem em uma ação judicial, que seria decidida por um magistrado. Já o setor processual busca a solução para o conflito, por meio de uma sessão de conciliação, quando o autor já entrou com a ação no Judiciário.

Valdemar estava com oito taxas de condomínio em atraso, e na sessão de conciliação no Cejusc da capital, conseguiu negociar sua dívida, em 15 minutos, para pagar o valor de R$3.900 em dez parcelas. “Estou muito satisfeito, não pensava que eu ia conseguir resolver tão rápido”, disse o devedor.

O Cejusc atua nas áreas cível e criminal. Os problemas mais comuns resolvidos ali são questões de consumo, ações de indenização, condomínio, despejo, cobrança e família. Todo processo tem uma primeira sessão de conciliação; caso as partes não cheguem a um acordo, o processo continua correndo normalmente.

“Nós temos, no Cejusc, uma pauta concentrada para a área de família, por exemplo. É uma pauta diferenciada, porque as questões familiares demandam um cuidado maior. O trabalho é feito pelos conciliadores, que conseguem tratar a desavença para que as próprias partes cheguem a uma conclusão sobre a melhor forma para dirimir o conflito. Não é interessante deixar para um terceiro, um juiz, decidir como a convivência familiar será regida, seja em relação ao divórcio, seja em relação aos filhos”, disse a juíza adjunta do Cejusc Dênia Francisca Corgosinho Taborda.

 

A juíza lembrou que na área de família a equipe do Cejusc se depara com diversos casos interessantes. Pais que entram com pedido de exoneração de pensão alimentícia quando os filhos atingem a maioridade e, na conciliação, acabam tratando de outras questões. Há casos em que o pai não convive com o filho ou a filha e tem a oportunidade de, no encontro, conversar e reatar laços desfeitos. Os conciliadores também já viram pais que, após a sessão, entenderam que o filho ou a filha atingiu a maioridade, mas ainda precisa de auxílio financeiro.

A conciliadora estagiária Renata Alvarenga, que atua no setor pré-processual, disse que normalmente as sessões de conciliação resultam em acordo. "Isso evita a judicialização, otimiza tempo e reduz custos, é benéfico para todos", afirmou.

Mutirão de conciliação da Cohab Minas em Santa Luzia

A Comarca de Santa Luzia promoveu um mutirão de conciliação com a Companhia de Habitação de Minas Gerais (Cohab Minas), veja a reportagem.

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