Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais

Palestras sobre autocomposição na esfera pública encerram congresso

Evento internacional promovido pelo TJMG contou ainda com diversos grupos de trabalho


- Atualizado em Número de Visualizações:
Not-autocomposicao-judiciario.jpg
 O II Congresso Internacional de Políticas Autocompositivas foi realizado à distância e iniciou-se em 10 de maio (Crédito: Cecília Pederzoli)

A justiça restaurativa no meio ambiente, a experiência do Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) Social do Tribunal de Justiça de Minas Gerais e a evolução das modalidades de resolução de conflitos foram os temas de palestras do último dia do II Congresso Internacional de Políticas Autocompositivas, realizado pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por meio da Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef), nesta sexta-feira (13/5). O evento, que começou na quarta-feira (10/5), foi realizado na modalidade virtual. 

Os trabalhos desta sexta-feira foram mediados pelo professor Sérgio Henriques Zandona Freitas, da Universidade Fumec. Na abertura, ele pontuou que o congresso já entrou para o calendário da Ejef e do TJMG como uma forma de incentivar e divulgar a política da autocomposição, que já vinha sendo desenvolvida individualmente, por vários magistrados — e que o TJMG abraçou, como uma forma de equacionar litígios que existem na sociedade.

O professor Sérgio Freitas disse que é servidor do TJMG há 30 anos e que, nessas três décadas, vem acompanhando a evolução do tribunal nesse campo. Ele observou que é visível a mudança de mentalidade entre juízes, promotores, advogados, serventuários e as próprias partes, no que se refere ao tema. Um movimento, de acordo com ele, fundamental, já que “não adianta o juiz ser solitário na defesa da autocomposição, se os outros partícipes não tiverem esse interesse”.

Meio ambiente

A primeira palestra, proferida pelo juiz Carlos Frederico Braga da Silva, titular da 5ª Unidade Jurisdicional Cível de Belo Horizonte, versou sobre a justiça restaurativa no meio ambiente. Ele teceu observações sobre normativas recentes das Organizações das Nações Unidas (ONU), da União Europeia e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em torno do tema.

O magistrado observou que, em algumas áreas do Direito, a autocomposição é muito mais frequente. “E não são áreas menos sensíveis, como Direito de Família, grandes questões de indenização, questões administrativas e questões ambientais. Mas, no mundo inteiro, ainda existe grande dificuldade na autocomposição ligada à lide de índole criminal”, disse. Segundo ele, é possível perceber que o sistema de justiça criminal, em todo o mundo ocidental, dá sinais de dificuldade para a responsabilização das pessoas envolvidas em lides de índole penal.

O juiz Carlos Frederico disse que teve acesso a uma pesquisa da Universidade da Bélgica, na qual constavam 346 relatórios sobre acidentes de mineração ocorridos em diferentes países. “O que é comum, em todos eles, é o fato de que até hoje, em nenhum dos casos, conseguiu-se responsabilizar criminalmente as pessoas envolvidas nesses acidentes, que envolvem o que chamamos hoje de violência corporativa”, contou.

O palestrante explicou, então, o conceito de violência corporativa: as companhias desenvolvem atividades, em tese, legítimas, mas que podem causar danos à integridade da vida das pessoas. “Existe uma grande dificuldade do sistema de justiça criminal de responsabilizar esse tipo de acidente, de tragédia ou de crime”, observou.

O juiz afirmou ainda que a proteção do meio ambiente e da sociedade, de maneira indireta, é antiga, apesar de estar muito reconhecida em normativas recentes. Ele citou como exemplo a Convenção de Estocolmo, de 1972. “Ocorre que, da maneira como as regras do Direito são propostas, não se consegue responsabilizar as pessoas envolvidas nesses tipos de evento.” O juiz afirmou que a cátedra canadense trabalha com o conceito de impunidade: mecanismos institucionais que neutralizam a incidência do Direito Penal.

Not-autocomposicao-judic-Carlos-Frederico-Braga-da-Silva.jpg
A primeira palestra foi proferida pelo juiz Carlos Frederico Braga da Silva, titular da 5ª Unidade Jurisdicional Cível de Belo Horizonte (Crédito: Cecília Pederzoli)

Justiça restaurativa

Na avaliação do magistrado, quando se insiste em lidar com esse assunto com base nas tradicionais teorias da pena, impede-se que outras formas sejam tratadas. “A racionalidade penal que adotamos são obstáculos epistemológicos que impedem a inovação do Direito Penal, para dizer o mínimo”, disse.

O juiz Carlos Frederico acrescentou: “Na verdade, o que estamos percebendo é que, no mundo inteiro, existe uma gigantesca insatisfação com o modelo adversarial e meramente retributivista. O Direito Penal tem que incidir, mas a grande dificuldade é quando centramos só na prisão, que significa exclusão social, dor e sofrimento. Nós temos alternativas para isso; temos de começar a pensar o conflito de uma maneira diferente”, ressaltou.

O palestrante detalhou algumas normativas atuais, que sugerem uma evolução identitária da sanção penal. Destacou, entre outras, a norma que ele considera uma das mais importantes dos tempos contemporâneos, a Agenda das Nações Unidas para 2030, que propõe uma mudança completa na maneira como os tribunais devem atuar. Citou também a chamada Declaração de Veneza, de 2021. Na sequência, abordou a justiça restaurativa e o papel do CNJ em sua disseminação.

Not-autocomposicao-judic-desa-Angela.jpg
A desembargadora Ângela de Lourdes Rodrigues falou sobre a experiência da mediação e da conciliação no Cejusc Social do TJMG (Crédito: Cecília Pederzoli)

Cejusc Social

A desembargadora Ângela de Lourdes Rodrigues falou sobre a experiência da mediação e da conciliação no Cejusc Social do TJMG, que ela coordena. “O Cejusc Social foi criado pela Portaria Conjunta 420, de 2015, e tem abrangência em todo o território de Minas Gerais para resolver conflitos territoriais, urbanos e rurais de grande repercussão social”, afirmou.

De acordo com a desembargadora, no Cejusc especializado têm sido feitas tentativas de conciliação e mediação de conflitos diversos, envolvendo indígenas, quilombolas, moradores em situação de rua e situações como invasões de terra e obras públicas paralisadas. A magistrada lembrou sua experiência no Cejusc Social para mostrar a importância da conciliação e da mediação e do potencial desses métodos para agilizar a solução de conflitos.

Um dos casos que a desembargadora Ângela Rodrigues apresentou foi o acordo envolvendo a ocupação Izidora, a maior ocupação urbana da América Latina, onde vivem 8 mil famílias e uma média de 30 mil pessoas. O acordo foi celebrado durante a 13ª Semana Nacional da Conciliação e envolveu a Companhia de Habitação de Minas Gerais (Cohab) e a Granja Werneck. “O acordo que fechamos possibilitou o encerramento de três volumosos processos”, contou.

A magistrada citou ainda o acordo no caso do clube Oásis, no bairro Santa Teresa, em Belo Horizonte, envolvendo uma ação de emissão de posse que era discutida desde 1970; o acordo referente à ocupação William Rosa, em Contagem, que envolvia cerca de 430 famílias; o acordo em um conflito envolvendo o transporte coletivo na capital mineira, que possibilitou a alteração de uma questão relacionada à frota; e o caso da Fazenda Buriti, movimento social de luta pela moradia, terra e reforma agrária, também referente a ação de reintegração de posse.

Ela também disse que foram realizadas audiências com o Estado de Minas Gerais e o município de Conselheiro Lafaiete, para a finalização das obras do Hospital Regional local, paralisadas desde 2012. Destacou ainda negociações que vêm sendo realizadas em relação a terrenos ocupados nas área conhecidas como Carolina Maria de Jesus e Vicentão — nesse caso, o Cejusc Social busca o assentamento de 228 famílias.

A desembargadora Ângela de Lourdes Rodrigues citou a situação dos moradores em situação de rua da capital mineira, ressaltando um processo, no qual já há um acórdão, transitado em julgado, que não permite que a Prefeitura de Belo Horizonte apreenda os pertences dessas pessoas. “Essa é uma população vulnerável, e temos lutado para dar efetividade aos seus direitos fundamentais, pois o acordo não está sendo cumprido.” Em relação especificamente a esse processo, a magistrada contou que várias audiências têm sido feitas.

Not-autocomposicao-judic-Magno-Federici-Gomes.jpg
O professor Magno Federici Gomes, da Escola Superior Dom Helder Câmara, foi um dos palestrantes (Crédito: Cecília Pederzoli)

Evolução das modalidades

“A evolução das modalidades de resolução de conflitos: autocomposição e jurisdição subterrânea” foi o tema da terceira e última palestra, proferida pelo professor Magno Federici Gomes, da Escola Superior Dom Helder Câmara. Em sua exposição, ele abordou alguns pontos sensíveis da autocomposição, dentro do sistema jurídico contencioso de resolução de conflitos no Brasil. Ele iniciou sua abordagem discorrendo detalhadamente sobre a questão do acesso à Justiça.

Entre os diversos pontos de sua palestra, o professor Magno Federici Gomes falou ainda sobre o processo como direito objetivo e a questão da judicialização, chamando atenção para o uso patológico do Poder Judiciário e para o déficit de juízes e servidores no Brasil, face ao grande volume de processos em tramitação no País. “Grandes querelantes estão abusando do exercício da jurisdição, para seus próprios interesses, pois há vantagens nesse litígio habitual”, observou. O professor falou ainda sobre o ativismo judicial.

Sobre a evolução das modalidades de resolução de conflitos, o professor Magno Federici Gomes listou a autotutela, a autocomposição, a jurisdição privada (arbitragem) e pública e, por fim, o regresso aos institutos anteriores e mediação. Na sequência, abordou o conceito de jurisdição subterrânea, refletindo sobre dois aspectos, em especial: o direito como instrumento de manutenção do poder e a constitucionalidade dos modelos mais acessíveis de justiça. Citou, ainda, alguns pontos de preocupação aos quais é preciso ficar atento no que se refere à autocomposição, a fim de buscar uma jurisdição sustentável.

As palestras desta sexta-feira e dos demais dias do II Congresso Internacional de Políticas Autocompositivas podem ser conferidas no Canal do Ejef/TJMG no YouTube.

Diretoria Executiva de Comunicação – Dircom
Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG
(31) 3306-3920
imprensa@tjmg.jus.br
instagram.com/TJMGoficial/
facebook.com/TJMGoficial/
twitter.com/tjmgoficial
flickr.com/tjmg_oficial