Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais

Especialistas abordam autonomia das partes em negócios e contratos

Estudiosos europeus discutem possibilidade em Congresso de Práticas Autocompositivas


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Tela de videoconferência
Convidados internacionais falaram sobre uso da autocomposição em contratos e na administração pública (Crédito: Cecília Pederzoli/TJMG)

O I Congresso Internacional de Políticas Autocompositivas do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) trouxe, nesta quinta-feira (2/12), possibilidades de entendimento dialogal entre as partes em relações negociais. A programação está sendo transmitida em tempo real pelo YouTube, e busca discutir, compreender e difundir métodos para a resolução de conflitos.

A abertura coube ao 3º vice-presidente do TJMG e coordenador do Núcleo Permanente de Métodos Consensuais de Solução de Conflitos (Nupemec), desembargador Newton Teixeira Carvalho. Os expositores foram os advogados e professores Giacomo Pongelli, da Universidade de Milão-Bicocca (Itália), e Marcos Vaquer Caballería, da Universidade Carlos III de Madri (Espanha).  

O 3º vice-presidente afirmou que a permuta de informações é de suma importância para a proposta de afirmação das políticas autocompositivas no país. “O TJMG é o segundo maior tribunal do Brasil e, neste momento de pandemia, temos algumas frentes de trabalho para atender à população: é o caso do Cejusc Virtual, pelo qual se podem selar acordos de qualquer lugar do mundo; do Cejusc Empresarial, voltado para as empresas que enfrentam dificuldades; e dos Centros Judiciários de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejuscs), que já foram instalados em 289 das 297 comarcas mineiras”, enumerou.

O desembargador Newton Teixeira lembrou que a obtenção de acordos não deve primar apenas pela quantidade, mas pela qualidade. “As palestras e lives que estamos realizando em parceria com a Escola Judicial Desembargador Edésio Fernandes (Ejef) têm essa finalidade. O mundo jurídico é muito conservador e nem sempre recebe bem as novas ideias, como é o caso dos métodos autocompositivos. Estamos convidando a sociedade a construir suas decisões e a ser ouvida”, disse.

Tela exibe homem de terno e gravata tendo ao fundo  estante com livros
O desembargador Newton Teixeira Carvalho falou sobre a necessidade de qualificar cada vez mais o exercício de métodos autocompositivos (Crédito: Cecília Pederzoli/TJMG)

O juiz auxiliar da 3ª Vice-Presidência, José Ricardo Véras, apresentou breve currículo dos palestrantes e moderou os debates, fazendo questionamentos e encaminhando aos professores perguntas dos participantes. A juíza Karen Montes, titular da 1ª Vara Cível de Itabira, fez a tradução consecutiva da exposição de Giacomo Pongelli, oferecendo ainda esclarecimentos sobre a correspondência ou não dos institutos legais da Itália com ferramentas adotadas no Brasil. A palestra do espanhol Marcos Vaquer Caballería contou com tradução simultânea contratada.

Contrato de transação

O professor Giacomo Pongelli explicou que, na Itália, os métodos de solução de conflitos se dividem em duas categorias: os heterônimos, nos quais um terceiro decide pelas partes, e autônomos, nos quais as partes assumem a decisão. Entre os heterônimos, as modalidades são o juízo estatal ordinário, em que as partes submetem a questão a um juiz, porém não no âmbito de um processo judicial, e a arbitragem, em que um terceiro é indicado pelas partes para decidir.

Nos métodos autônomos, há aqueles que ocorrem com a participação de terceiros — a mediação, a negociação assistida (correspondente à conciliação) — e os que se dão envolvendo exclusivamente as partes, embora seja possível a ajuda de um advogado, denominados contrato de transação e negócio de acertamento. Nesses, não há um terceiro nomeado e as próprias partes estabelecem condições para resolver um conflito.

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O advogado Giacomo Pongelli apresentou o contrato de transação, instrumento de autocomposição do direito italiano (Crédito: Cecília Pederzoli/TJMG)

Pelo contrato de transação, as partes põem fim a um processo já começado ou previnem o ajuizamento de uma lide fazendo concessões mútuas. Com esse procedimento é possível criar, modificar ou extinguir relações diversas das que originaram a disputa. No negócio de acertamento, não há concessões. Ele existe para dar certeza e estabelecer o entendimento, por exemplo, quando dois fazendeiros cujos terrenos fazem limite definem onde termina e onde começa a propriedade de cada um.

A jurisprudência, segundo o estudioso italiano, reconhece transações simples e novativas. As primeiras extinguem toda uma relação jurídica. As últimas, menos usadas, são mais pertinentes ao contexto da autocomposição, pois equivalem à novação brasileira, que instaura uma nova obrigação que substitui e extingue a obrigação preexistente. Caso exista uma questão de nulidade, ela só pode se referir à forma do contrato, não ao conteúdo, pois isso seria interferir na vontade das partes.

Autocomposição na Espanha

Segundo o professor Marcos Vaquer, a tradição de autocomposição na Espanha é bem diferente da brasileira e da italiana. “No direito administrativo espanhol, a determinação do interesse geral na execução das leis compete à administração pública, que o faz por resoluções administrativas laterais relativas aos procedimentos administrativos. Portanto, tais poderes administrativos são exercidos unilateralmente. Quando existem controvérsias em torno de decisões da administração pública, os conflitos são resolvidos na própria administração pública, pela via administrativa. Se eles persistem, aí pode haver recursos contencioso-administrativos, no âmbito judicial”, diz.

Homem de meia idade assentado em escritório de trabalho
Segundo o professor Marcos Vaquer, a autocomposição vem ganhando espaço no direito administrativo espanhol (Crédito: Cecília Pederzoli/TJMG)

De acordo com o pesquisador, há forte resistência do poder público espanhol à autocomposição, por razões teóricas e práticas. A primeira se baseia no dogma da intransigibilidade dos interesses gerais, que entende que estes se sobrepõem a interesses particulares, e, portanto, não pode haver transação para garanti-los, já que a administração pública apenas cumpre o que a lei determina. O motivo prático para se opor a esses métodos é que a administração pública se colocaria em situação de igualdade com indivíduos e outras instituições, sujeitando-se ao poder de terceiros, e deveria renunciar ao exercício unilateral do poder e aos privilégios da autotutela.

Contudo, nos últimos tempos, surgiram agentes de mudança nesse cenário: a cidadania se tornou mais ativa, surgiram precedentes históricos, a administração pública mostrou-se morosa demais para atender às necessidades e se passa a reconhecer “a eficácia de um smart power administrativo, que prefere a persuasão à coação e busca consensos”.

Acesse a íntegra das palestras. 

GTs

À tarde, as exposições dos grupos de trabalho sobre negociações complexas, justiça multiportas, mediação, acesso à justiça e justiça restaurativa foram coordenadas pelo juiz Marcus Vinícius Mendes do Valle, que também levou perguntas do público aos expositores. Houve pesquisas de magistrados, assessores servidores e funcionários do TJMG e de outras cortes de justiça, advogados, pesquisadores, professores e estudantes.

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O juiz Marcus Vinícius Mendes do Valle conduziu os trabalhos de apresentação dos resumos expandidos (Crédito: Cecília Pederzoli/TJMG)

Entre os destaques, houve a proposta de Simone Letícia Severo e Sousa Dabés Leão e da desembargadora do TJMG Teresa Cristina da Cunha Peixoto, “Sistema Multiportas: caminhos adequados para solução de conflitos”, que tratou das contribuições do modelo para o poder público e a sociedade.

Os oficiais de justiça do TJMG André Pedrolli Serretti e Jonathan Porto Galdino do Carmo falaram sobre a contribuição do oficial de justiça no fomento à autocomposição na execução de ordens judiciais, com alusão ao projeto “Conciliação em Domicílio", implantado de forma piloto na comarca de Governador Valadares e elaborado pelo oficial de justiça Luiz Antônio Braga de Oliveira.

O desembargador Newton Teixeira Carvalho trouxe, com Déborah Danniele de Brito e Freitas, o tema “Acesso à Justiça por Meios Autocompositivos sob a Égide da Orientação do Nupemec/TJMG Nº 01/2020”, propondo que a tentativa prévia de obtenção de acordos seja considerada condição para aferição do interesse processual.

Gina Chaves e o desembargador Saulo Versiani Penna trataram da “Institucionalização Brasileira da Autocomposição como Corolário do Devido Processo Legal”. A servidora do TJMG, Gisele Luiza Soares Moura, juntamente com Simone Cristina Dufloth, apresentou dois trabalhos, sobre o acesso à justiça efetiva justa e igualitária e sobre o uso da tecnologia no Judiciário.

O juiz convocado Roberto Apolinário de Castro e Gabriela Oliveira Freitas abordaram a isonomia como condição de eficácia dos acordos. Já o juiz auxiliar da 1ª Vice-Presidência, Rodrigo Martins Faria, discutiu a inovação das plataformas de resolução de disputas online orientadas por inteligência artificial.

Veja o conteúdo completo da tarde. Confira as apresentações aprovadas e matéria sobre a programação de 1/12.

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